sexta-feira, 30 de novembro de 2012

A necessidade de reforma quanto ao "silêncio" e á "última palavra" da Administração Pública


O presente texto apresentar-se-á como um dos vários contributos que têm sido dados para a reforma da justiça administrativa e conduz-nos para uma reflexão sobre dois grandes problemas: a inacção da Administração Pública e a da palavra judicialmente recorrível.
Esta necessidade de uma reforma da justiça administrativa deve realizar-se tendo em conta simultaneamente o dever constitucional da Administração Pública de prosseguir o interesse público e o direito dos cidadãos a uma tutela judicial efectiva ( a própria Constituição defende este mesmo objectivo, artigo 266º).

Quanto ao silêncio da Administração pública, tem-lhe sido até agora atribuído, quanto a uma solução, um significado positivo ou negativo sempre que exista o dever legal de decidir. Começou por atribuir-se um significado negativo, para permitir que os interessados pudessem impugnar contenciosamente a decisão desfavorável.
Posteriormente, para melhor proteger os particulares e obrigar a Administração pública a decidir, atribui-se ( a certos casos) um significado positivo ao silêncio, entendendo-se que a não decisão do prazo configurava-se como uma decisão positiva.

Há que atender que apesar de haver uma grande apreciação desta solução, atribuindo ao silêncio da Administração um direito desta, a verdade é que há um dever e não um direito. A decisão é um dever da Administração Pública (artigo 9º do CPA) , que tem de ser cumprido. Este dever introduz-se claramente no sentido do “(…) respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos”. É neste sentido que devemos tutelar os direitos dos cidadãos, dado que o particular tem o direito de exigir, através do Tribunal, que a Administração Pública decida sobre a pretensão que este apresentou.
Nesse sentido entramos em duas possíveis situações:

- se a decisão da Administração, judicialmente exigida, seja favorável, o problema encontra-se resolvido, terminando assim o processo;
- no caso de não a aceitar, o particular deve ter o direito de prosseguir judicialmente, combatendo-a para que lhe seja dada a razão que julga ter.

Esta solução, obrigava a Administração Pública a cumprir o seu dever e o particular teria a possibilidade de ter uma decisão expressa praticada, adoptando a que lhe fosse mais conveniente. O problema agravar-se-ia se mesmo assim a Administração Pública persistir no silêncio.
A situação actual, leva-nos a um problema mais complexo.
Actualmente, o facto de se atribuir significado positivo á não decisão no tempo devido, permite aos particulares obter “decisões” favoráveis ilegais.
É de propor-se uma sanção ao silêncio positivo da Administração, dadas as vantagens indevidas concedidas aos particulares que ofendem claramente os interesses públicos.
A actuação da Administração necessita obviamente de uma averiguação por dois motivos perceptíveis ao longo desta exposição: a sua inactividade e infracção da lei.

Nomeadamente á “última palavra”, este tem sido um assunto muito debatido, pois para chegar aos tribunais há que se proceder através do recurso hierárquico, mantendo-se o esgotamento da via administrativa?
O artigo 268º, nº4 da CRP, defende o direito do particular poder dirigir-se, face a uma decisão desfavorável, por efeito do silêncio ou por atitude positiva, aos tribunais.
Esta mesma acção tem revestido uma fonte de denegação de justiça aos particulares, pelo facto de não terem impugnado administrativamente e terem corrido directamente aos tribunais.
Vendo doutra perspectiva, é simplesmente chocante a sanção processual desproporcionada que sofre quem actua com excesso de diligência.
Vieira de Andrade, defende a necessidade de recurso hierárquico dado que a parte só deve dirigir-se a juízo depois da “última palavra” da Administração Pública, uma vez que permite á parte ponderar a sua decisão evitando assim o recurso directo aos tribunais.
Todavia quando o recurso aos tribunais deve-se a uma decisão que não é a última palavra, não é de aceitar a sanção prevista – a perda de pretensão.

Dada a dificuldade em apreender se a decisão constitui ou não a palavra recorrível da Administração publica o mais adequado é que se o tribunal considerasse que não estava dada a “última palavra” da Administração, fosse suspenso o processo, para que o particular pudesse suscitar o acto recorrível.
Esta acção permitiria ao particular provocar a decisão do orgão competente e caso esta decisão não lhe agradasse o processo prosseguiria.
Contudo, sendo esta a reforma que se propõe, convém explanar a conduta do particular caso lhe seja emitida uma decisão desfavorável.

Neste caso este deve:

- Impugnar administrativamente;
- Recorrer contenciosamente;

Impugnando administrativamente, o particular aguarda uma decisão do Superior e fica em carteira com a possibilidade de recurso contencioso.
Recorrendo contenciosamente, acerta se o tribunal entender que a decisão é recorrível de imediato, caso contrário pode também recorrer contenciosamente da decisão do superior.
A “última palavra” não tem de ser necessariamente a dita verticalmente definitiva.

Hoje vigora entre nós, um princípio constitucional favorável á recorribilidade imediata dos actos administrativos que lesam direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, que só cede perante disposição da lei em sentido contrário.


Jéssica Faria
nº21989 

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